Ano passado eu decidi plantar diferente, eu racionalizei e verbalizei exatamente a vida que eu gostaria de construir. Fui muito clara em conversas com as amigas, em oração, em casa com a minha família. Daquilo que eu reclamava no meu íntimo todos os dias, fiz uma lista dos inegociáveis, porque percebi que eu me coloquei disposta a muita coisa que não apoio por ter um par de bocas pra alimentar. E de todas as coisas massacrantes do capitalismo, atravessar seus limites pra dar qualidade de vida pra quem você ama deve ser o que mais me tira a saúde. A gente cede em momentos que não vislumbra saída inteligente, porque convenhamos, elas existem, por mais que os coaches da internet falem que sua melhor chance é se vender o tempo todo pra ter sucesso. Hoje em dia a fórmula vendida é a de que todos somos capazes de chegar onde buscamos, normalmente em um passe de mágica e um novo posicionamento de marca. Com um blazer e um recorte de podcast falso, você vai subir seu ticket médio e surpreender a concorrência. Como se envelopar uma mudança bastasse pra ela acontecer. Tenho uma realidade dura pra dividir com você: pra tudo mudar você vai precisar mudar também.
Por causa dessas benditas habilidades de comunicação, acabei no caminho do marketing digital, e olha, eu não indico pra ninguém essa vida de ser vendedor na internet. O tanto que ela deturpa a sua ideia de realidade, responsabilidade e criatividade é triste. Eu amo criar conteúdo pra internet, amo transformar o sonho de uma família em sustento com foto, vídeo e conteúdo. De aproximar o campo da mesa, o artesanal da nossa vida tão urbana. Gosto de estar com pessoas que lutam pelo seu negócio porque lá eles são justos com quem veste a camisa, bancam o sonho de outras pessoas e fazem a roda girar. O que me massacra é vender um capitalismo doente, onde o lucro está acima do trabalhadores, que as pessoas não veem problema algum com escalas que tiram dessas pessoas a oportunidade de viver uma vida digna. Todo e qualquer conteúdo que vende alguma coisa na internet, rouba o tempo das pessoas com quem eles amam. Pra ter o tênis da moda, a bolsa da blogueira ou jantar naquele lugar badalado, você vai precisar de horas de trabalho, alguns itens dias, outros semanas. Banalizamos a experiência do viver como se ela fosse simples e normalizamos o querer desenfreado daquilo que não precisamos, pela urgência de nos transformamos naquilo que não somos: uma projeção vazia das pessoas que acompanhamos na internet e que de nada sabemos.
Nos últimos dois anos, tudo que fiz foi prestar mais atenção em mim, em quem eu sou, no que me move. Aprendi que quanto mais tempo eu gasto com os meus pensamentos, meus desafios, meu crescimento, me sobra menos pra olhar pro vizinho, pra cobiçar o que não tenho, pra apontar defeitos na vida perfeita que eu construí pra mim. Parei de sucumbir e ficar desejando o tênis novo, a viagem da fulana, a louça estampada da loja X. No mês de dezembro fiz um laboratório: reduzi em 50% o tempo gasto nas redes sociais e no celular. Passei a não pegar no telefone de manhã, não ligar ele aos sábados e não levar ele comigo pela casa. Sabe o que eu percebi? A internet tá sequestrando a minha vida. E provavelmente a sua também! O tempo que eu gasto online não é dos mais viciados e relevantes, porque infelizmente uma boa parcela do que eu faço pra pagar contas é online, mas isso também me dá muita desculpa pra desperdiçar meu tempo como parte de uma “pesquisa” de mercado. A verdade é que esse tempo que eu passava nas redes sociais me fez zero falta e eu percebi que me abriu várias portas pra coisas que eu não fazia mais, desde cuidar da minha casa a ser mais criativa com meu tempo em família. Os minutos de manhã na cama ao invés de ser conferindo o que as pessoas postaram, passou a ser o tempo que voltei a escrever, olhar pro céu, colocar a minha energia no meu dia. Abrir meu tarot, fazer café pro meu amor, alimentar meus bichos. O tempo se alargou! Esfreguei minhas roupas no tanque, organizei armários, pendurei quadros e fiz listas de coisas pra arrumar na casa. Me joguei em novas receitas e esqueci de fotografar todas elas porque já nem ligava mais. Fiz um cinema em casa com bomboniere e ingressos impressos. No sábado de sol deitei na grama da minha casa e me queimei de sol enquanto ouvia música e bebia um vinho laranja. Li livros, nadei na minha piscina (que mais parece um ofurô de tão pequena) e ela deve ter sorrido, porque ninguém entrava lá a mais de 3 meses.






A vida que eu amo existe pra além do intervalo das telas, e a sua?
Seu argumento irracional provavelmente será “você poderia fazer todas essas coisas mesmo olhando suas redes”. Podia mesmo, mas não com essa presença. Teria um plano de fundo aberto na minha mente, esse que te faz abrir as redes sem objetivo nenhum, como se você precisasse fugir da vida que tanto luta pra ter. Você quer mesmo fugir dessa realidade ou você so tá vivendo na realidade alheia? Eu consigo me divertir e gerar conteúdo, mas a minha vida precisa ser um conteúdo sempre ou posso ser mais estratégica, não no sentido de postar o que engaja e sim de postar pontualmente pra me permitir mais presença em cada dia que vivo? A gente se desconecta do cuidado com a gente e com o outro por causa da internet. Justamente porque o tesão que você deveria sentir na sua vida, é suprido pela dopamina rápida que assistir a vida de alguém te proporciona. A satisfação de ver alguém viver sem perrengue, sem falta, sem dificuldade. O recorte agradável de uma receita saída do forno, uma casa sendo arrumada, uma corrida que você não transpirou. Enquanto você assiste a tudo, a energia vital que te move até os seus sonhos se esvai. E se você posta uma foto, faz um stories, fica faminto pela aprovação, os likes, as DM's. Já testou postar e não olhar mais? Postar pelo desejo de dividir mas sem expectativa de receber nada em troca? Postar aquilo que sente que tem uma mensagem pra outra pessoa, que contribui pra vida dela de alguma forma, sem viver na prisão de criar uma personagem pra agradar? Depender das curtidas de desconhecidos é esperar aprovação e a aprovação pra quem trabalha com influência gera dinheiro, e você começa a medir quem você é pra agradar os outros. Quantas vezes gravei os mesmos stories porque medi as palavras pra não desagradar ninguém e ate hoje falo cada vez menos por não suportar o julgamento que automaticamente vem com a exposição da minha opinião sobre qualquer coisa, mesmo que banal, porque não tenho energia pra justificar minha visão de mundo e sinto que na verdade nem preciso disso, porque cada um de nós vive essa vida pra aprender, crescer e melhorar, não pra pregar verdades absolutas.
Nesse tempo que meu pequeno laboratório de férias me permitiu estar mais offline, por vontade e recesso, vi que quanto menos tempo eu passo na tela, mais vontade eu tenho de cuidar da minha vida e das pessoas que eu amo. Quase como se a minha energia vital, aquilo que me move e me tira da cama, fosse gradualmente roubada pela internet, pouco a pouco sem nem que eu perceba. E parece uma coisa meio Si-Fi, mas eu te desafio a amanhã mesmo você colocar um limite da metade do que consome hoje e me conta como se sentiu. Sobra tempo!!! Sobra uma penca de minutos pra fazer um monte de coisa que você vive “cansado” pra fazer mas na real não é cansaço, é falta de vontade, APATIA!
Eu voltei ao trabalho, voltei a usar mais o telefone mas tô me segurando ao máximo pra não ir pros mesmos números, porque eu vi que tô entediada, vi que não tô me movendo 100% na direção da pessoa que eu quero ser por pura apatia. Eu entendi que as vezes tô evitando apenas estar em silêncio comigo mesma, ou porque viciei no gesto de abrir e fechar o app pra procurar um nada na vida alheia que eu percebi que nem acho tão legal assim. Juro, que mudança isso causou em mim. É obvio que o vício pede vigília, pede que eu lute todos os dias contra a mania de abrir o app pra não lidar com a vida que me cabe, e eu vou perder essa batalha algumas vezes antes de vencer pra sempre, mas agora me sinto atenta. Me sinto mais realista e até menos doida mesmo, porque entendi de verdade o que eu mesma perco.
Esse mês eu troquei meu hábito no carro, esse de checar o telefone no semáforo ou trabalhar via ligação com alguém do meu time, por audio livros. E escolhi o Propósito do Prem Baba e ele escreveu algo que quero carregar comigo pra sempre:
“O desapego é o que possibilita a escolha, e a escolha possibilita a liberdade. Só podemos ser livres quando temos a chance de escolher conscientemente.”
E aí eu te deixo algumas perguntas que me fiz e ainda faço durante esse processo pra te ajudar a chegar na sua essência, aquilo que você verdadeiramente é sem que ninguém esteja olhando, ou seja, sem estar no seu telefone esperando a sua vida ser vivida pela sua versão digital:
Você faz o que você faz porque você é assim ou porque você quer parecer interessante pras pessoas?
O que você faria se não pudesse postar nada da sua vida?
O que você nota sobre você quando fica sozinha no carro em silêncio, ou durante o seu banho?
O que te roubou a presença hoje? Seu dia estava normal até que alguma coisa ou alguma pessoa roubou a sua atenção é depois disso você se perdeu. O que foi que fez isso? Que te levou a rolar redes sociais ou a procrastinar no trabalho.
Tenta pensar nisso durante essa semana e me conta?
Mas nada aqui é pra ser levado a sério né? Tudo não passa de um devaneio.
Beijos e até depois!
Me inspirou ainda mais. Obrigada querida 😘
Li só um pedaço, achei tão a minha cara. Vou até ler depois melhor por inteira e com calma.
Por aqui também tatuando na minha alma o que é inegociável.